[:pb]Foram mais de três décadas até o Brasil conseguir implantar um modelo de saúde mental mais humanizado. Mas todo esse avanço, que teve como principal marco a Reforma Psiquiátrica, em 2001, deu lugar agora ao retrocesso. É o que avalia Leonardo Pinho, presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme). Durante um seminário realizado no Instituto de Saúde Coletiva da UFBA, no dia 22 de fevereiro, ele falou sobre as principais implicações da nova política de saúde mental que se desenha no país.
A crítica de Leonardo Pinho vem logo após a divulgação de uma nota técnica publicada pelo Ministério da Saúde, no início deste mês, e que prevê mudanças polêmicas no tratamento da saúde mental no Brasil. Entre os principais itens, o documento destaca o financiamento para compra de aparelhos de eletrochoque, incentivo às comunidades terapêuticas, aumento de leitos psiquiátricos e a possibilidade de internação de crianças e adolescentes.
Portarias e Decretos
Apesar de ter gerado surpresa e muitas discussões, a nota não trouxe novidade alguma ao presidente do CNDH. Segundo ele, o documento apenas arremata um conjunto de portarias e decretos que já vinham sendo implementados no país desde 2017. “Esses decretos e portarias fizeram a política nacional de saúde mental retroceder mais de 30 anos.”, avalia Leonardo Pinho.
Os hospitais psiquiátricos, por exemplo, já tinham seu retorno previsto na Portaria 3.588, publicada pelo Ministério da Saúde em 2017, quando passaram a integrar a Rede de Atenção Psicossocial (Raps). A rede, composta por serviços e equipamentos variados, como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), tem como objetivo original desenvolver a reabilitação psicossocial das pessoas atendidas.
“É importante destacar que a Reforma Psiquiátrica nunca se colocou contrária às internações. Era um dispositivo a ser usado em um momento muito específico do projeto terapêutico.” Para ele, o risco está, justamente, em trazer a internação para o centro da saúde mental. “O que a gente precisa é que a Raps e os seus dispositivos sejam melhor financiados e ampliados, para se recorrer cada vez menos aos leitos.”, completa.
A indústria de leitos
Os dados apresentados pelo presidente do CNDH revelam que o orçamento para a saúde mental em 2018 não foi distribuído de forma satisfatória no Brasil. Do total de 320 milhões, dois terços foram destinados à rede privada, formada por hospitais psiquiátricos, manicômios e comunidades terapêuticas. Assim, apenas um terço dos recursos acabou destinado, de fato, aos demais equipamentos públicos da Raps. “Ou seja, recurso público para irrigar um modelo de saúde privada.”, critica Pinho.
A disputa pelos recursos do SUS parece ganhar um capítulo importante em 2018, com a publicação da Portaria 2.434, que aumentou em 60% os valores das diárias pagas aos hospitais que realizam internamentos por mais de 90 dias. Segundo o presidente do Conselho, a portaria do Ministério da Saúde fez crescer a permanência desses pacientes nas unidades. “Volta aquela visão de que as pessoas podem ser retiradas do convívio social e serem colocados em lugares de internação, já que começa a se receber mais verbas por isso.”, analisa.
Ilegalidade X Mobilização
Para Leonardo Pinho, todas as medidas anunciadas e implementadas nos últimos dois anos, carimbadas com a publicação da nota técnica em 2019, deixam claro que se trata da criação de uma nova política de saúde mental. Portanto, precisariam, primeiro, passar pelo Plenário do Conselho Nacional de Saúde. “A lei é clara: a participação social não é uma opção do governo, é uma obrigatoriedade quando se trata de implementar e criar novas políticas.”, observa.
Ainda segundo o presidente do CNDH, já existem recomendações do Conselho Nacional de Saúde para que sejam revogadas essas portarias. Mas, até o momento, o Ministério da Saúde apenas informa que a nota técnica está em consulta interna no SEI (Sistema Eletrônico de Informações) para receber contribuições de servidores do ministério e de outros órgãos, como o Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e o Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde).
Para Leonardo Pinho, o momento é de mobilização. “Precisamos construir uma frente democrática para defender os direitos humanos e uma ideia de saúde promotora que transforme vidas.”, conclui.
Para assistir na íntegra à palestra com Leonardo Pinho, acesse este link.
[:en]It was more than three decades before Brazil was able to implement a more humanized mental health model. But all this advance, which had as its main milestone the Psychiatric Reform in 2001, has now given way to retrogression. This is what evaluates Leonardo Pinho, president of the National Council of Human Rights (CNDH) and vice president of the Brazilian Association of Mental Health (Abrasme). During a seminar held at the UFBA Institute of Collective Health on February 22, he spoke about the main implications of the new mental health policy that is being designed in the country.
Leonardo Pinho’s criticism comes shortly after the release of a technical note published by the Ministry of Health earlier this month, which predicts controversial changes in the treatment of mental health in Brazil. Among the main items, the document highlights the financing for the purchase of electroshock devices, incentive to therapeutic communities, increase of psychiatric beds and the possibility of hospitalization of children and adolescents.
Ordinances and Decrees
Although it generated surprise and many discussions, the note did not bring any news to the president of CNDH. According to him, the document only concludes a set of ordinances and decrees that had been implemented in the country since 2017. “These decrees and ordinances made the national mental health policy go back more than 30 years,” says Leonardo Pinho.
Psychiatric hospitals, for example, already had their return expected in Ordinance 3,588, published by the Ministry of Health in 2017, when they joined the Psychosocial Care Network (Raps). The network, composed of various services and equipment, such as the Psychosocial Care Centers (Caps), has as its original objective to develop the psychosocial rehabilitation of the people attended.
“It is important to highlight that the Psychiatric Reform was never opposed to hospitalizations. It was a device to be used at a very specific moment in the therapeutic project. ”For him, the risk lies precisely in bringing hospitalization to the center of mental health. “What we need is for Raps and its devices to be better funded and expanded to make less use of beds.”
The bed industry
Data presented by the CNDH president reveal that the mental health budget in 2018 was not distributed satisfactorily in Brazil. Of the 320 million total, two thirds went to the private network, consisting of psychiatric hospitals, asylums and therapeutic communities. Thus, only a third of the funds actually went to Raps’ other public equipment. “That is, public resources to irrigate a private health model.”, Criticizes Pinho.
The dispute over SUS resources seems to win an important chapter in 2018, with the publication of Ordinance 2434, which increased by 60% the daily rates paid to hospitals that perform hospitalizations for more than 90 days. According to the president of the Council, the Ministry of Health ordinance increased the permanence of these patients in the units. “It returns to that view that people can be removed from social life and placed in places of detention, as more money is being received for this,” he says.
Illegality X Mobilization
For Leonardo Pinho, all the measures announced and implemented in the last two years, stamped with the publication of the technical note in 2019, make it clear that this is the creation of a new mental health policy. Therefore, they would first need to go through the National Health Council Plenary. “The law is clear: social participation is not a government option, it is a must when it comes to implementing and creating new policies.”
Also according to the president of CNDH, there are already recommendations from the National Health Council to revoke these ordinances. But so far, the Ministry of Health only informs that the technical note is in internal consultation in SEI (Electronic Information System) to receive contributions from ministry officials and other agencies, such as Conass (National Council of Health Secretaries). ) and Conasems (National Council of Municipal Health Secretariats).
For Leonardo Pinho, the moment is mobilization. “We need to build a democratic front to defend human rights and a health-promoting idea that transforms lives,” he concludes.
To watch the full lecture with Leonardo Pinho, visit this link.[:es]Pasaron más de tres décadas antes de que Brasil pudiera implementar un modelo de salud mental más humanizado. Pero todo este avance, que tuvo como hito principal la Reforma Psiquiátrica en 2001, ahora ha dado paso al retroceso. Esto es lo que evalúa Leonardo Pinho, presidente del Consejo Nacional de Derechos Humanos (CNDH) y vicepresidente de la Asociación Brasileña de Salud Mental (Abrasme). Durante un seminario celebrado en el Instituto de Salud Colectiva de la UFBA el 22 de febrero, habló sobre las principales implicaciones de la nueva política de salud mental que se está diseñando en el país.
La crítica de Leonardo Pinho se produce poco después del lanzamiento de una nota técnica publicada por el Ministerio de Salud a principios de este mes, que predice cambios controvertidos en el tratamiento de la salud mental en Brasil. Entre los elementos principales, el documento destaca el financiamiento para la compra de dispositivos de electrochoque, el incentivo para las comunidades terapéuticas, el aumento de camas psiquiátricas y la posibilidad de hospitalización de niños y adolescentes.
Ordenanzas y decretos
Aunque generó sorpresa y muchas discusiones, la nota no trajo ninguna noticia al presidente de la CNDH. Según él, el documento solo concluye un conjunto de ordenanzas y decretos que se han implementado en el país desde 2017. “Estos decretos y ordenanzas hicieron que la política nacional de salud mental se remontara a más de 30 años”, dice Leonardo Pinho.
Los hospitales psiquiátricos, por ejemplo, esperaban su retorno en la Ordenanza 3.588, publicada por el Ministerio de Salud en 2017, cuando se unieron a la Red de Atención Psicosocial (Raps). La red, compuesta por diversos servicios y equipos, como los Centros de Atención Psicosocial (Caps), tiene como objetivo original desarrollar la rehabilitación psicosocial de las personas atendidas.
“Es importante destacar que la Reforma Psiquiátrica nunca se opuso a las hospitalizaciones. Era un dispositivo para ser utilizado en un momento muy específico en el proyecto terapéutico ”. Para él, el riesgo radica precisamente en llevar la hospitalización al centro de salud mental. “Lo que necesitamos es que Raps y sus dispositivos estén mejor financiados y expandidos, para hacer menos uso de las camas”.
La industria de la cama
Los datos presentados por el presidente de la CNDH revelan que el presupuesto de salud mental para 2018 no se distribuyó satisfactoriamente en Brasil. Del total de 320 millones, dos tercios fueron a la red privada, compuesta por hospitales psiquiátricos, asilos y comunidades terapéuticas. Por lo tanto, solo un tercio de los fondos se destinó a otros equipos públicos de Raps. “Es decir, recursos públicos para regar un modelo de salud privado”, critica Pinho.
La disputa sobre los recursos del SUS parece ganar un capítulo importante en 2018, con la publicación de la Ordenanza 2434, que aumentó en un 60% las tarifas diarias pagadas a los hospitales que realizan hospitalizaciones durante más de 90 días. Según el presidente del Consejo, el decreto del Ministerio de Salud aumentó la permanencia de estos pacientes en las unidades. “Se remonta a la opinión de que las personas pueden ser retiradas de la vida social y puestas en lugares de detención, ya que se está recibiendo más dinero por esto”, dice.
Ilegalidad X Movilización
Para Leonardo Pinho, todas las medidas anunciadas e implementadas en los últimos dos años, estampadas con la publicación de la nota técnica en 2019, dejan en claro que esta es la creación de una nueva política de salud mental. Por lo tanto, primero tendrían que pasar por la Plenaria del Consejo Nacional de Salud. “La ley es clara: la participación social no es una opción del gobierno, es imprescindible a la hora de implementar y crear nuevas políticas”.
También según el presidente de la CNDH, ya hay recomendaciones del Consejo Nacional de Salud para revocar estas ordenanzas. Pero hasta ahora, el Ministerio de Salud solo informa que la nota técnica se encuentra en consulta interna en SEI (Sistema de Información Electrónica) para recibir contribuciones de funcionarios del ministerio y otros organismos, como Conass (Consejo Nacional de Secretarios de Salud). ) y Conasems (Consejo Nacional de Secretarías Municipales de Salud).
Para Leonardo Pinho, el momento es la movilización. “Necesitamos construir un frente democrático para defender los derechos humanos y una idea promotora de la salud que transforme vidas”.
Para ver la conferencia completa con Leonardo Pinho, visite este enlace.[:]