Com representantes dos 417 municípios do estado, movimentos sociais, profissionais de saúde, autoridades e academia, entre outros públicos, a 11ª Conferência Estadual de Saúde (Conferes) da Bahia reuniu cerca de três mil pessoas na Arena Fonte Nova, nos dias 05, 06 e 07 de junho. A conferência, que teve como tema “Garantir Direitos e Defender o SUS, a Vida e a Democracia – Amanhã Vai Ser Outro Dia”, contou com a participação de docentes no ISC entre os homenageados e em palestras para discussão dos eixos temáticos do evento.
A abertura da 11ª Conferes foi marcada pela primeira edição do prêmio “Construtores do SUS”, que homenageou 35 atores que tiveram uma contribuição importante para a construção e implementação das políticas, programas e ações de saúde, com atuação em defesa de um SUS mais universal, integral, equânime e participativo. O professor Luis Eugenio de Souza, diretor do ISC, foi um dos premiados.
No segundo dia do evento, a vice-diretora do instituto, Joilda Nery, fez reflexões e apontou inquietações referentes ao eixo I da conferência – “A Bahia que temos. A Bahia que queremos”. Destacando que o espaço da conferência reitera a importância da participação popular em saúde para a construção de políticas públicas e para o fortalecimento do SUS, a docente ressaltou a relevância dos debates e materiais produzidos nas várias conferências livres realizadas antes da 11ª, debateram perspectiva de raça, gênero e ciclo de vida. “Aqui uso a minha voz para discutir uma pauta e objetivos em comum: a luta pela Reforma Sanitária Brasileira e pela justiça social”, declarou.
O enfrentamento ao racismo foi ponto importante da fala de Nery – “A maior parte da população do estado é negra, não somos minoria. Não estou aqui representando a minoria, estou representando a maioria da população baiana”. Enquanto um determinante estrutural do tecido social, o racismo precisa estar nas discussões e ser enfrentado, sob o risco de não ser possível avançar na luta pelo SUS, explicou, destacando marcos legais da saúde da população negra, inclusive o reconhecimento do racismo como determinante social da saúde.
Para a docente, na luta pelo SUS é preciso diálogo com a Educação, Segurança pública, Meio ambiente, e diversas agendas dos determinantes sociais da saúde. “Seu fortalecimento é essencial para preservar vidas humanas, principalmente as que estão em maior vulnerabilidade social: pardas, pretas e indígenas”, reforçou. Sua apresentação deu enfoque ao debate para um novo pacto social “para que todas as pessoas possam viver com dignidade”.
Entre as propostas para debate na conferência, a pesquisadora indicou, entre outros pontos, o fortalecimento da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra; a valorização dos saberes tradicionais e ancestrais; o combate ao racismo institucional; maior financiamento ao SUS; equidade no acesso à saúde; a implantação de centros para tratamento de doença falciforme; políticas e ações para as populações indígenas e migrante; educação e sensibilização de profissionais de saúde na perspectiva antirracista e pró-equidade; e o trabalho com componentes intersetoriais que abarquem a política de combate à fome, de demarcações de terras e reforma agrária, o combate ao uso de agrotóxicos, ao racismo religioso.
No âmbito do eixo III – “Garantir direitos e defender o SUS, a vida e a democracia”, o professor Maurício Barreto ressaltou o vínculo sólido e multidirecional entre saúde, que deve ser entendida como um fenômeno complexo, com múltiplas determinações, e democracia. Enquanto o último governo colocou em risco a essência da recente democracia brasileira, o que resultou em relações interrompidas, o governo eleito no último ano retoma o processo democrático brasileiro que estava enfraquecido, apontou o pesquisador.
Para Barreto, o atual contexto do país lembra a histórica 8ª Conferência Nacional de Saúde, com a necessidade de reafirmação da saúde como dever do Estado e direito do cidadão.
Os reflexos do passado colonial brasileiro, que inclui violência genocida contra a população originária e escravização da população de origem africana, em uma sociedade desigual, racista e injusta foram destacados pelo docente. Ele exemplificou citando estudo do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs), que aponta que o risco de morte por desnutrição é 16 vezes maior na população indígena; o risco de morte por diarreia é 14 vezes maior. Nesse cenário, o coordenador do Cidacs chamou a atenção para as várias evidências que mostram que políticas pró-equidade – como o Bolsa Família, Luz para todos, Ações afirmativas e Políticas de cotas – têm impactos positivos na saúde.
Barreto finalizou afirmando que há uma disputa ideológica do SUS em jogo. No atual contexto de um renascer democrático do Brasil, conclamou os participantes para o debate e elaboração de propostas que contribuam para a construção de uma sociedade democrática e inclusiva e para a defesa do SUS enquanto projeto emancipatório.