A professora Joilda Nery, vice-diretora do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA, foi uma das convidadas do Ministério da Saúde para representar o país na reunião da Cúpula de Inovação da Rede de Pesquisa sobre Tuberculose (TB) do BRICS. O encontro foi realizado em Durban, na África do Sul, entre os dias 10 e 14 de dezembro, com a participação de pesquisadores do Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
O evento tem como objetivo compartilhar experiências e definir uma agenda de cooperação de pesquisa em vacinas, diagnósticos, tratamentos e práticas bem-sucedidas de saúde pública entre os países membros do BRICS. A professora integrou uma delegação de 20 pesquisadores da Rede Brasileira de Pesquisas em Tuberculose (Rede TB), sendo a representante da região Nordeste.
Em sua apresentação, a professora Joilda Nery abordou o impacto da tuberculose entre as populações mais vulnerabilizadas no Brasil, especialmente as pessoas em situação de rua. Foram compartilhados resultados de pesquisas recentes e projetos do Instituto de Saúde Coletiva, em parceria com outras instituições, que evidenciam a incidência elevada de tuberculose nesses grupos, bem como as dificuldades de acesso a serviços de saúde, emprego, renda, assistência social e educação.
Uma das pesquisas apresentadas analisou os fatores associados ao insucesso no tratamento da tuberculose entre pessoas em situação de rua no Brasil, de 2015 a 2020. O estudo foi conduzido pelos pesquisadores Osiyallê Akanni Silva Rodrigues, Hammed Oladeji Mogaji, Layana Costa Alves, Renzo Flores-Ortiz, Cleber Cremonese e Joilda Nery.
Os resultados da pesquisa apontam que essa população tem o dobro de risco de tratamento mal sucedido em comparação com pessoas com moradia. Entre os principais fatores de risco para resultados negativos de tratamento na população em situação de rua estão o uso de drogas ilícitas, transtornos mentais e o tratamento sem a supervisão adequada.
“As nossas conclusões reforçam os argumentos a favor de uma abordagem intersetorial e integral para abordar estes determinantes da saúde entre as populações vulneráveis sem moradia e meios para subsistência”, destacou a professora.
Outra pesquisa discutida pela professora no evento investigou o perfil de casos de tuberculose notificados em mulheres em situação de rua, entre os anos de 2014 e 2019, e a relação com a determinação de gênero no contexto apresentado. Além da professora Joilda Nery, o estudo contou também com a participação das pesquisadoras Isabella Soares Castelo e Simone Santana da Silva.
Os resultados indicaram um alto percentual de retratamento (36,5%) e falha de tratamento (43,5%) para a doença. Comparando com os homens nas mesmas condições, essas mulheres apresentaram menor percentual de cura (29,7%), maior uso de drogas ilícitas (68,7%), coinfecção por HIV/AIDS (35,9%) e doença mental (8,4%).
“Através deste estudo, identificamos que as mulheres em situação de rua manifestam características singulares em relação ao adoecimento por tuberculose, tornando urgente a necessidade de readequação dos serviços de saúde para esse segmento social e a promoção de melhor apoio sociopolítico”, observou Joilda Nery.
Declaração de Durban
Os países do BRICS são responsáveis por 70% dos casos globais de tuberculose no mundo e, por serem grandes lideranças, têm o potencial de definir estratégias para a eliminação da doença até 2030. No evento, os pesquisadores e especialistas em saúde pública dos países membros e da Organização Mundial da Saúde reconheceram a tuberculose como um desafio significativo para alcançar vários Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em seus países e destacaram a importância da inovação para um crescimento equitativo e sustentável.
A reunião também apoiou as metas da ONU de 2023 sobre tuberculose, enfatizando o fortalecimento e financiamento da capacidade de pesquisa e colaboração. Foi criada a Iniciativa de Vacina contra tuberculose do BRICS, para acelerar a pesquisa e o desenvolvimento de vacinas, colaborando com o Conselho Acelerador de Vacinas contra a tuberculose da OMS.
Os participantes expressaram preocupação com a falha do mercado em produzir diagnósticos, medicamentos e vacinas novos e antigos para combater a tuberculose, apontando para a lentidão e limitações no desenvolvimento de produtos essenciais. Reconheceram a fragmentação e a duplicação de esforços na pesquisa e desenvolvimento da tuberculose, que leva a práticas monopolistas e dificulta a oferta de inovações acessíveis.
Foram acordados trabalhos colaborativos, incluindo a transferência de tecnologia e compartilhamento de conhecimentos, para melhorar os cuidados clínicos e promover inovações centradas no paciente. A declaração também incluiu o compromisso de reforçar a cooperação transnacional no financiamento e realização de pesquisas, visando transformar os países do BRICS de consumidores para fornecedores de ferramentas inovadoras e acessíveis contra a tuberculose. Além disso, foi firmado um compromisso de promover publicações científicas e trabalhar com autoridades reguladoras e a OMS para acreditar e registrar novas ferramentas de diagnóstico, medicamentos e vacinas, mantendo uma colaboração próxima com a OMS para atividades futuras.