No Dia da Consciência Negra (20), em que temas como discriminação racial e luta pela liberdade de manifestação religiosa e cultural ganham mais visibilidade, o Observatório apresenta dados sobre a saúde da população negra e discute as políticas de saúde voltadas para doença falciforme, enfermidade cuja trajetória de atenção no Brasil é marcada pelo racismo institucional.
Um levantamento da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS, 2012) aponta que, da mortalidade infantil a mortes por causas externas, a população negra é a mais atingida. Segundo os dados, a mortalidade materna, por 100 mil habitantes, é de 68,8 para mulheres negras e 50,6 para mulheres brancas; das mortes na primeira semana de vida, 47% são de crianças negras e 38% de crianças brancas; 60,8% dos novos casos de tuberculose aconteceram na população negra; das mortes de homens jovens de 15 a 29 anos por causas externas, 59% são negros e as principais causas incluem homicídios (62%) e acidentes de trânsito (22%).
Diabetes, hipertensão arterial e doença falciforme são as doenças mais comuns na população negra (SVS, 2012). As taxas de mortalidade são superiores ao registrado na população parda e branca, no caso da primeira, e há maior risco de morte entre pretos e pardos no caso da segunda. A doença falciforme, por sua vez, teve a taxa de mortalidade dobrada no Brasil de 2000 a 2012. A enfermidade é mais predominante na população negra, cujas taxas de mortalidade, por 100 mil habitantes, foram 0,73 para pretos e 0,28 para pardos. A taxa de mortalidade na população em geral foi de 0,23. Veja mais indicadores e outras informações aqui.
Doença falciforme: sintomas são variados e afetam qualidade de vida
Os sintomas e as manifestações da doença falciforme são vários: anemia crônica; icterícia (cor amarelada nos olhos); dores abdominais, osteoarticulares; enfartes pulmonares; insuficiência cardíaca; pneumonia; glaucoma; úlceras de perna, entre outros. A doença é genética, hereditária e causada por uma mutação que produz uma hemoglobina denominada S (HbS) ao invés da hemoglobina normal, A (HbA), o que resulta em problemas no transporte de oxigênio para o corpo. Leia mais aqui e aqui.
O diagnóstico correto e precoce, assim como o tratamento adequado com profissionais de saúde e informação para as famílias é essencial para evitar quadros mais graves da doença. O sofrimento e a interferência na qualidade de vida das pessoas levaram a pesquisadora Ana Luísa Dias (ISC-UFBA) a estudar o histórico terapêutico de pacientes com úlcera de perna. A dissertação defendida no Instituto de Saúde Coletiva (ISC/UFBA), em 2013, recebeu Menção Honrosa na edição 2013 do Prêmio de Incentivo em Ciência e Tecnologia para o SUS.
Ana Luísa explica que as feridas nas pernas costumam surgir ainda na adolescência, a partir dos 10 ou 12 anos, e são extremamente dolorosas. Diferente de crises de dor que podem ser pontuais e espaçadas, a dor da úlcera de perna é diária, contínua e não cessa. “Em uma escala de 0 a 10, a dor relatada pelas pessoas que eu entrevistei, e que é muito comum ouvir, é de 7 a 10. […] É uma ferida que pode ter odor, pode ter secreção, e impacta diretamente na qualidade de vida e em todo processo do viver”. Na pesquisa, Ana Luísa encontrou uma paciente que passou mais de quatro décadas convivendo com a doença: dos 14 aos 54 anos, idade em que foi entrevistada. “Isso traz intercorrências nos relacionamentos amorosos, familiares e na escola, então muitas pessoas saem da escola por conta de toda essa carga que a úlcera traz, demandando uma questão de cuidado ainda maior do que a doença crônica de base já traz, impacta no lazer, no viver, nas questões de trabalho e aí gera um ciclo em que, para a pessoa e a família, é difícil sair. É algo extremamente silenciado”, explica.
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