Quais medidas foram adotadas para a proteção e segurança dos profissionais e trabalhadores de saúde no enfrentamento da pandemia de Covid-19? E quais as estratégias de apoio ao trabalho das equipes de saúde foram implementadas? A mesa “Trabalhadoras/es da saúde: o desafio de cuidar na conjuntura pandêmica”
apresentou elementos que mostram que houve improviso na gestão da força de trabalho e que a proteção dos trabalhadores não foi prioridade nas ações. Para as pesquisadoras do Instituto de Saúde Coletiva (ISC), os resultados podem ajudar gestores a aprender com a experiência dos últimos dois anos e ter melhor preparo para o enfrentamento de outras possíveis epidemias.

Na mesa, que contou com a participação das pesquisadoras Catharina Matos, Liliana Santos e Paloma Brandão, foram apresentados resultados preliminares do trabalho em andamento no âmbito do projeto ObservaCovid (https://observacovid.analisepoliticaemsaude.org/) – “Análise de Modelos e Estratégias de Vigilância em Saúde da Pandemia de Covid-19”. As ações de vigilância em saúde voltadas para a proteção dos trabalhadores e redução dos riscos e o tratamento dos danos causados por eles, no período de 2020 a 2022, foram investigados e analisados a partir de um estudo de caso realizado em três municípios da Bahia e duas capitais do país, envolvendo unidades de Atenção primária à saúde (APS), hospitais de referência em atendimento aos casos de Covid-19 e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).

A necessidade de mais trabalhadores de saúde para atender demandas colocadas pela pandemia resultou em profissionais com uma multiplicidade de vínculos trabalhistas, muitas vezes envolvendo a APS e os hospitais de referência, com acúmulo de riscos de contágio pelo novo coronavírus. Enquanto muitos países reduziram a carga horária de seus trabalhadores da saúde, no Brasil houve sobrecarga. Por sua vez, o olhar sobre a organização e os fluxos de trabalho nos serviços da APS revelou que ajustes feitos no ambiente de trabalho, no geral, não tinham como objetivo a proteção à saúde dos trabalhadores.

Na atenção básica houve ainda distinção na oferta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), com maior dificuldade de acesso e diferença na qualidade do que era ofertado aos agentes comunitários de saúde (ACS) em relação a outros trabalhadores da APS, uma expressão da hierarquia social do trabalho. Diferenças no acesso aos EPIs também foram relatadas por profissionais do SAMU, que muitas vezes assumiram os custos de EPIs não disponibilizados pelos serviços ou ofertados de qualidade duvidosa.

Entre os trabalhadores da SAMU, 31,82% apontaram falta de diálogo com as equipes para reestruturação dos fluxos internos. Enquanto 68,94% informaram que não houve mudanças físicas na ambiência de trabalho, 20,45% consideraram as mudanças realizadas insatisfatórias, por exemplo, nos locais para desinfecção e desparamentação e na falta de espaço físico mínimo entre locais com possíveis contaminações e copas e confortos.

O estudo revelou também que 42,48% dos trabalhadores do SAMU tiveram transtornos mentais comuns, relacionados ao humor, vitalidade, sintomas somáticos e pensamentos depressivos. Para as pesquisadoras, o achado pode estar relacionado à escassez de ações estratégias da gestão do trabalho no âmbito da saúde mental dos trabalhadores.

Na APS, 74% dos trabalhadores sentiram a necessidade de ter um acompanhamento em saúde mental, número duas vezes maior do que os 35% de profissionais entrevistados que indicaram essa necessidade antes da pandemia. Entre os trabalhadores de saúde de hospitais de referência, a incerteza da duração da pandemia, o medo de se contaminar e contaminar família e colegas, a falta de terapia comprovada para o tratamento da Covid-19 e a carga de trabalho extenuante foram os principais motivos para a busca de atendimento.